2020: o ano da imaginação
É certo que 2020 ainda não acabou, mas, por outro lado, ele "voou". A pandemia pegou a todos nós de surpresa e tivemos de lidar com uma situação que era aceitável, no máximo, em filmes de ficção.
Diante disso, muitos acontecimentos: home-office forçado, filhos em casa, conflitos conjugais, excesso de telas, poucas atividades físicas, poucas atividades culturais, excesso de (des)informação, etc.
Adicionalmente, é mais um ano de eleição, aquele em que diversas Fake News são disparadas massivamente nas redes, aquele em que pessoas que nunca leram um livro sobre política se veem como grandes cientistas políticos; aquele em que pessoas que nunca deram chance ao contrário, se veem como grandes conciliadoras; aquele em que pessoas que nunca foram autoridades em nada, exceto em suas fantasias de onipotência, se veem autoridades intelectuais, especialmente nas redes sociais.
O ano de 2020 tem sido confuso, complexo, diferente e também muito cansativo para alguns de nós, especialmente para aqueles que intencionam genuinamente PENSAR. Pensar dá trabalho, exige autocrítica, exige busca por informações, exige iniciativa, exige vontade. Do contrário, corremos um grande risco de cairmos nas marés de "queixas da quarentena" ou na "fantasia intelectual das redes sociais".
Faço uma analogia com o meu trabalho como Analista: diversos clientes buscam num terapeuta a resposta para suas angústias ou um ouvido atento para suas queixas. Isso não é análise. A análise é exigente e chama os mesmos itens do pensar: autocrítica, busca de novas informações, iniciativa, vontade, interesse, curiosidade (de se conhecer) e muito mais. Não há análise sem que o analisando queira fazer isso. Ir ao psicólogo, apenas, não é fazer análise.
É por isso que mais do que pensar, sobre as coisas ou sobre nós, estamos carecendo de imaginação. A imaginação não é binária, não é cartesiana, não é concreta, não é material. Ela flutua no ar e penetra na mente; atravessa as águas e invade nosso corpo; ela queima nosso pensamento e nos traz inspiração; ela irrompe do solo e nos traz senso de realidade. Imaginar é uma troca consigo e com o mundo, assumindo que tudo aquilo que achamos que somos, pode ser todo o contrário, e que o mundo somos nós e nós somos o mundo; que tudo aquilo que nos queixamos, pode ser, na verdade, um problema nosso, e que nós mesmos sejamos parte da solução.
Quando a imaginação não voa, ela fica agarrada à fantasia de controle e, portanto, torna-se ansiosa; quando ela fica como uma água represada, se transforma em angústia e então deprime; quando sua flama da inspiração é contida, ela queima e arde, tal como um burnout; quando ela ignora os princípios de realidade, ela fica tomada por um pensamento fantasioso, que torna-se paranóico e obsessivo. Vamos imaginar, por meio dos opostos, pela busca por cultura, pelo nosso processo analítico, pela cura da nossa alma coletiva, pela observação cautelosa e crítica do caos mundano. Imaginar é dar a nós mesmos a chance de sermos partes atuantes e integrantes da mudança que queremos ver no mundo.
Rafael é psicólogo, fundador da Solução Ativa, Analista Junguiano em formação e professor no IJEP. Especialista em Administração pela FGV/SP e em Psicologia Junguiana pelo IJEP. Atualmente está cursando a Especialização em Psicossomática pelo IJEP e fazendo Mestrado em Comunicação e Teorias do Imaginário pela UNIP. Em 2019 fez curso de aprofundamenteo no Instituto CG Jung em Zurique, Suíça. Atende em seu consultório particular na Vila Mariana em São Paulo e o Brasil (mundo?) inteiro, via online. Autor do livro "Pessoal e profissional: a distinção que a vida não faz".